22 de junho de 2007

Como se fossem dois adolescentes

A meio da tarde, no bar, havia mesas livres; o casal entrou, escolheu uma delas, olharam os dois em redor e, já instalados, pediram que lhe servisse duas bebidas.

Os olhares perdiam-se pelas paredes, onde estavam exposta pinturas do Wild de Wildt, Rui Monteiro e Alberto Péssimo; a. música ambiente aconchegava o sossego do momento e o tom das suas vozes era suave.

Tocou um telemóvel, a senhora atendeu, levantou apenas um pouco a voz e falou em francês, expedita, de forma alegre. Repetiu por três vezes merci, e continuou, veloz, na articulação das palavras – sinal de que, para si, a língua de Nicolas Sarkozy lhe era familiar…

O cavalheiro, entretanto, inquire sobre o espaço: é público, não? Respondo afirmativamente. Sabe, acrescenta, como tem um estilo completamente diferente do habitual, a minha esposa deduziu que fosse um “clube privado”. Em traços largos, explico que o comércio das bebidas era um pretexto para algumas actividades culturais - a exposição que tinham à sua frente era um exemplo disso mesmo.

Terminada a conversa, foi a vez da senhora parabenizar os autores das obras expostas e quem tivera o arrojo de colocar de pé o espaço como se apresenta.

Agradeci a generosidade do que foi dito.

Pergunto se estão de férias por estas paragens. Responde a senhora: de férias já estamos há imenso tempo, somos reformados, e viemos de Leiria passar uns dias a esta região, que desconhecíamos em absoluto, pernoitamos na Pousada do Convento do Desagravo e durante o dia damos uns passeios por aí. É muito lindo, tudo aqui à volta, a serra, tudo!

O encantamento do olhar, transmitia alegria, satisfação, prazer, felicidade na forma mais pura – que sei eu desse sublime sentimento?

Sempre de sorriso nos lábios, desenhados num rosto de enorme beleza, disse ao que vieram em concreto, desvendou o segredo, enquanto o marido, talvez um pouco envergonhado, olhava terno e meigo a “jovem” e bonita esposa: faço hoje oitenta anos, e o meu marido presenteou-me com este magnífico passeio.

Oitenta?

Não, não imaginava aquela figura esbelta, meã na altura e aspecto prazenteiro com uma mão cheia de “viçosas primaveras”, muito próxima do centenário que, acrescentei, por certo irá comemorar…

Pedi licença por breves segundos, saí, fui à florista Clara, logo na esquina, comprei uma rosa (que não paguei, por que a Clara conhece de longe o meu “vício” por flores e partilha comigo a sensibilidade do belo, e volta não volta tem destas delicadezas…), e com o meu melhor sorriso ofereci-a à bonita senhora – apenas uma lembrança com que procurei honrar o seu aniversário e o amor do casal

…Fiquei com a sensação de que a rosa vermelha “ganhou vida própria” e um “rosto” – “um dos olhinhos sorriu, atirou-me uma piscadela” e eu fiquei a ver o casal, de mão dada, rua acima, como se fossem dois adolescentes apaixonados.